O projecto 8!8!8! - a luta pela conquista do tempo, Pedro Penilo



Com o dobrar do século, configura-se uma nova forma de escravatura, que não necessita de grilhetas, mas é igualmente alienante. Conjugam-se com grande eficácia os mecanismos de produção de reservas de desempregados, de extrema desregulação das relações de trabalho e de captura dos salários pelos sistemas de crédito, com o controlo e manipulação dos sistemas de produção e intermediação de cultura, informação e ideologia, de um modo digno de uma descrição orwelliana.

Volta à ordem do dia a velha reivindicação dos “três oitos” – oito horas de trabalho, oito horas para dormir, oito horas para fazer o que se quiser! – aquela que no imediato corresponde às aspirações mais urgentes dos homens e mulheres manietados por este estado de crise geral e subversão de pilares da civilização.

É a consecução dessa exigência uma essencial condição objectiva para a liberdade individual e colectiva que fundamentam uma sociedade democrática e justa.

Obstáculo de peso à ferocidade predatória que hoje domina a economia mundial, a reivindicação das 8 horas de trabalho define, como ciclo natural e vital do ser humano e da sua felicidade, o dia e a noite. Numa mesma rotação da Terra sobre si mesma, na alternância de luz e sombra, com a influência que elas têm na nossa biologia e psicologia, devem, homens e mulheres, percorrer o ciclo do trabalho, do prazer, do amor e do repouso.


Hoje, quando um número significativo de trabalhadores já alcançou este limite máximo de tempo de trabalho diário, está em curso uma fortíssima campanha tendente a eliminar de uma assentada esta conquista histórica e civilizacional, impondo a seres humanos bárbaras condições de vida. Particularmente as jovens gerações, recentemente entradas no mercado de trabalho, já não encontram um tempo e organização do trabalho que respeite a sua condição humana, a justa ambição a ter mais da vida do que a cadeira de um call center, a caixa de um supermercado ou o estaleiro da obra.

Entendemos que a arte pública tem uma responsabilidade agravada perante o(s) outro(s). O conceito – discutível e falível – de arte pública só sobrevive se for entendido como forma de partilha efectiva, em comunicação com a sociedade, dos seus temas, preocupações, e mesmo linguagens, e não como simples “arte ao ar livre”.

O projecto “8!8!8!” tem como suporte central uma série de nove cartazes, que simultaneamente proclamam e desenvolvem o argumentário que sustenta esta reivindicação. Esses cartazes deverão ser expostos em suportes MUPI, no espaço público. São acompanhados por um blogue que integra textos sobre o tema. É assumidamente um projecto de intervenção política, promovido por um artista; logo busca a eficácia, que será sempre despertar imediatamente discussão e simpatia para uma causa que não é pessoal, mas colectiva.

A linguagem utilizada é a comunicação gráfica urbana, generalizada no mundo industrial. Ao contrário de outras linguagens possíveis, o observador reconhece nela e espera dela uma intenção funcional, informativa, tendencialmente denotativa, mesmo quando confrontado com sinais, figuras ou configurações que não estão codificados. Esse convite à leitura mais do que à contemplação, à compreensão mais do que à comoção, justifica, quanto a mim, esta opção.

Pedro Penilo
29 de Junho de 2009